IN DUBIO PRO FISCUM – Com base na prevalência do interesse público, no voto divergente do ministro Alexandre de Moraes referente ao Recurso Extraordinário interposto em face de acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em que se discute o Tema 842 da repercussão geral:
“Incidência de Imposto de Renda sobre os depósitos bancários considerados como omissão de receita ou de rendimento, em face da previsão contida no art. 42 da Lei Nº 9.430/1996”.
Teve o seu desfecho ao encerrar do mês de abril de 2021.
Em seu voto o Ministro:
“Fixo a seguinte tese para fins de repercussão geral: O artigo 42 da Lei 9.430/1996 é constitucional”.
O autor sustentava que ele e sua esposa, mantinham conta conjunta, foram autuados pela Receita Federal do Brasil em razão de ausência de recolhimento do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) referente a movimentações financeiras efetuadas em instituições financeiras. Estas movimentações na conta corrente decorriam de depósitos em cheques, dinheiro ou títulos, oriundos de clientes “que operavam empréstimos, junto ao casal, operando como verdadeira instituição de “factoring”.
Alegou também (dentre outros pontos) a nulidade do auto de infração, em razão da inconstitucionalidade do Art. 42 da Lei 9.430/1996 (Dispõe sobre a legislação tributária federal, as contribuições para a seguridade social, o processo administrativo de consulta e dá outras providências) referente a Depósitos Bancários segundo o qual, caracterizam-se também a omissão de receita ou de rendimento os valores creditados em conta de depósito ou de investimento mantida junto a instituição financeira, em relação aos quais o titular, pessoa física ou jurídica, regularmente intimado, não comprove, mediante documentação hábil e idônea, a origem dos recursos utilizados nessas operações, dentre outras alegações em sua defesa.
Por fim, a Receita Federal lavrou auto de infração, por ausência de recolhimento do Imposto de Renda, com fundamento no Art. 42 da Lei 9.430/1996.
Ponto crucial a ser destacado é que tais movimentações efetuadas em instituições financeiras, refere-se aos exercícios fiscal de 1998, 1999 e 2000.
Portanto, neste período não dispúnhamos das diversas normas atuais de combate à sonegação e lavagem de dinheiro, assim, cabe destacar resumidamente em vista do caso em tela:
- Lei Nº 9.613 de 1998 – Lei de Combate aos Crimes de Lavagem de Dinheiro:
Esta lei trata dos crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores, cria o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF), obriga a adoção de controles internos, estabelece penalidades.
Apesar de sua temporalidade, necessitou-se de um intervalo de dois anos para implementação da norma, haja vista, as modificações estruturantes em diversos órgãos de controle.
- Circular Nº 3461 de 2009 do Banco Central do Brasil:
Esta circular trata dos procedimentos a serem aplicados para combater os crimes previstos da Lei Nº 9.613 de 1998. Também regulamenta as auditorias e induz às noções de transparências.
- Lei Nº 12683 de 2012 – Lei dos Crimes de Lavagem de Dinheiro
Altera a Lei n. 9613 de 1998, tornando-a mais severa, principalmente ao punir atos de lavagem de dinheiro oriundos de qualquer origem ilícita.
- Instrução Normativa RFB Nº 1571, de 02 de julho de 2015.
Dispõe sobre a obrigatoriedade de prestação de informações relativas às operações financeiras de interesse da Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB).
Em seu Art. 7º determina que as entidades bancárias, estão obrigadas à apresentação das informações relativas às operações financeiras mencionadas nos incisos I, II e VIII a XI do caput do Art. 5º, quando o montante global movimentado ou o saldo, em cada mês, por tipo de operação financeira, for superior a:
I – R$ 2.000,00 (dois mil reais), no caso de pessoas físicas.
II – R$ 6.000,00 (seis mil reais), no caso de pessoas jurídicas.
- Instrução Normativa RFB Nº 1761, de 20 de novembro de 2017.
Dispõe sobre a obrigatoriedade de prestação de informações à Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB) relativas a operações liquidadas em espécie.
Estas informações serão prestadas mediante o envio de formulário eletrônico denominado Declaração de Operações Liquidadas com Moeda em Espécie (DME).
No Art. 4º temos:
São obrigadas à entrega da DME as pessoas físicas ou jurídicas residentes ou domiciliadas no Brasil que, no mês de referência, tenha recebido valores em espécie cuja soma seja igual ou superior a R$ 30.000,00 (trinta mil reais), ou o equivalente em outra moeda, decorrentes das operações a que se refere o Art. 1º, realizadas com uma mesma pessoa física ou jurídica. Via portal da Receita Federal do Brasil.
- Decreto 9.580/2018:
Regulamenta a tributação, a fiscalização, a arrecadação e a administração do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza.
Quanto ao acréscimo patrimonial não justificado (Art. 47, XIII) São também tributáveis:
XIII – as quantias correspondentes ao acréscimo patrimonial da pessoa física, apurado mensalmente, quando esse acréscimo não for justificado pelos rendimentos tributáveis, não tributáveis, tributados exclusivamente na fonte ou objeto de tributação definitiva.
Art. 911 – Dos sinais exteriores de riqueza:
O contribuinte que detiver a posse ou a propriedade de bens que, por sua natureza, revelem sinais exteriores de riqueza, deverá comprovar, por meio de documentação hábil e idônea, os gastos realizados a título de despesas com tributos, guarda, manutenção, conservação e demais gastos indispensáveis à utilização desses bens.
Art. 913 – No que se refere aos depósitos bancários não comprovados:
Caracterizam-se também como omissão de receita ou de rendimento, sujeito a lançamento de ofício, os valores creditados em conta de depósito ou de investimento mantida junto a instituição financeira, em relação aos quais o titular, pessoa física ou jurídica, regularmente intimado, não comprove, por meio de documentação hábil e idônea, a origem dos recursos utilizados nessas operações ( Lei Nº 9.430, de 1996, Art. 42, caput ).
§ 3º Para fins de determinação da receita omitida, os créditos serão analisados de forma individualizada e não serão considerados
II – na hipótese de pessoa física, sem prejuízo do disposto no inciso I, os créditos de valor individual igual ou inferior a R$ 12.000,00 (doze mil reais), desde que o seu somatório, no ano-calendário, não ultrapasse o valor de R$ 80.000,00 (oitenta mil reais).
§ 4º Na hipótese de pessoa física, os rendimentos omitidos serão tributados no mês em que forem considerados recebidos, com base na tabela progressiva vigente à época em que tenha sido efetuado o crédito pela instituição financeira.
Veja que em tudo o contribuinte teve assegurado seu direito ampla defesa e o do contraditório sendo intimado para comprovar a origem dos depósitos nas contas efetuados na fase que precede à lavratura do auto de infração, e no decurso processual.
Cabe ressaltar que em tese a mesma analise poderá ser objeto vinculativo a conta corrente de pessoa jurídica guardada as devidas proporções.
- Em síntese:
Ministro Marco Aurélio, relator, destaca que não cabe presumir que todos são sonegadores, e “é incompatível, com a CF, o artigo 42 da lei 9.430/96, a autorizar a instituição de créditos do imposto de renda tendo por base, exclusivamente, valores de depósitos bancários cuja origem não seja comprovada pelo contribuinte no âmbito de procedimento fiscalizatório”.
Mas a tese vencedora é do Ministro Alexandre de Moraes, que em resumo, para se furtar da obrigação de pagar o tributo e impedir que o Fisco procedesse ao lançamento tributário, “bastaria que o contribuinte fizesse mera alegação de que os depósitos efetuados em sua conta corrente pertencem a terceiros, sem se desincumbir do ônus de comprovar a veracidade de sua declaração“.
Decisão vale para os casos em que a Receita entender que valores podem ser enquadrados como receita-faturamento.
Clayton Leão – Advogado e Profissional Contábil